sexta-feira, fevereiro 08, 2013

As Trevas da Paixão - Gil # 8

Não faço ideia se existe vida para além da morte. Se existe inferno e paraíso. Mas se existir, gostaria muito que me fizesse sentir como me tenho sentido nos últimos dias, porque sinto-me como se o paraíso tivesse descido à terra e me tivesse dado um free passe. A vida com Gil era assim mesmo, um verdadeiro paraíso. Ele tinha adaptado o seu turno ao meu. Trabalhávamos mais ou menos nos mesmos horários. Tínhamos as folgas em modo compatível e a vida sorria.

Mais ou menos. Por passar demasiado tempo com Gil, tinha deixado de estar tanto tempo com Diana, que para seu azar, tinha entrado numa maré de poucos funerais. Sim, também na indústria dos mortos havia picos. Ora morria gente às carradas, ora não havia ninguém para morrer. Nem mesmo a tia Micas de noventa e nove anos que continuava a beber o seu bagaço todas as manhãs dava sinal de fraqueza.
                Mas Diana, ainda que ficasse um pouco triste e deprimente, nunca me permitia que fosse ter com ela, quando sabia que tinha combinado alguma coisa com Gil. Ainda assim sentia-me culpada por não dar mais tempo e atenção à minha melhor amiga.
                E então surgiu-me uma ideia, Gil tinha-me dito que muito provavelmente estaria a trabalhar a próxima noite, porque devia um favor a um colega que tinha aniversário de casamento e não podia faltar nem que chovessem pêssegos. Sim, estes tipos de datas são importantes. Devem ser comemoradas. No entanto, tínhamos combinado ir comer Sushi e ele não queria desmarcar, com medo que eu ficasse chateada e porque também já tinha feito a reserva e, uma vez que tinha reservado um prato especifico, perderia a caução se cancelasse.
                Liguei ao Gil e expus-lhe a minha ideia. Ele concordou e ficou feliz por lhe ter resolvido o assunto. Estava decidido, eu e Diana íamos ter uma girls night com direito a jantar num dos melhores restaurantes de Sushi da cidade, cortesia do meu doutor. Segundo ele, um jantar para matar saudades da minha amiga.
                Diana explodiu em risinhos e gargalhadas quando soube o que tínhamos pela frente. Ela delirou com a ideia e deixou-me muito contente. Finalmente a minha vida corria sobre rodas.
                Gil era um homem como poucos. Tratava-me como uma verdadeira princesa. Contado ninguém acreditava. Era um verdadeiro achado, o meu doutor.
                Claro que era vítima da inveja alheia. Principalmente e maioritariamente feminina. Principalmente se a pessoa em questão fosse Matilde, que desde que soubera que eu e Gil andávamos me deixou de falar e passou a agir como se eu a tivesse traído. Olhava-me com frieza e quase a podia ver mudar de cor quando por algum motivo nos encontrávamos por acaso nos elevadores do hospital. Edifício que passei a frequentar mais do que alguma vez esperaria, porque é o que acontece quando se namora um médico.
                Podem não acreditar, mas uma vez, calhou de nos encontrarmos dentro do elevador. Senti que ela me queria dizer alguma coisa. Alguma coisa má, se é que me entendem. No entanto, Matilde saiu do elevador com um olhar gelado e um sorriso mau nos lábios, como se soubesse um segredo que merecia ser revelado e que não o fazia se não por maldade.
Afinal Diana tinha uma vez mais razão, ela era mesmo uma insossa que não conseguia viver com a felicidade dos outros.
                Maus pensamentos de parte, comecei a preparar-me para o jantarinho com a minha melhor amiga. Somos diferentes como a agua e o vinho e no entanto é como se fosse impossível viver sem ela.
Suponho que uma verdadeira amizade seja isto mesmo. Pelo menos para mim, é de certeza.
                Diana encarregou-se de chamar o táxi e de me vir buscar a casa. Segundo ela, se era uma noite de mulheres tinha que ter álcool, e se tinha álcool, não podíamos conduzir. Além disso os táxis funcionavam muito bem numa noite destas. Não que tencionássemos beber até entrar em coma, mas era sempre bom precaver.
                Diana estava linda. E eu também modéstia à parte. A relação com Gil fazia-me bem. Diana tinha um vestido com algumas transparências de cor preto, que lhe caiam como uma luva em cima das suas curvas. O cabelo apanhado num gancho dourado davam-lhe um glamour de estrela de cinema. Já para não falar nos seus sempre fieis saltos agulha que deixavam qualquer um de rastos. Eu tinha optado por uma blusa, toda transparente, com um enorme laço na fronte, uma saia de cinta subida, muito esbelta, que me dava pelos joelhos e claro está, uns botins de salto alto a condizer. Estávamos as duas demasiado chiques para ir comer peixe cru com pauzinhos mas vá, era uma noite especial.

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