sábado, fevereiro 23, 2013

As Trevas da Paixão - Gil # 10




Nesta altura da minha história, muitos de vocês já devem ter perguntado como é que uma rapariga como eu consegue ter tanto azar. Pois é, meus queridos, nem eu vos sei responder. Só sei que fiquei sem palavras quando entrei no maldito vestiário e vi o meu homem entalado entre duas mulheres…
Uma atrás dele, a beijar-lhe as costas e a outra, a que estava diante dele, a dar-lhe um dos seus mamilos a provar, fitou-me o olhar aterrorizado e brindou-me com o seu melhor sorriso.
                Diana tinha razão, Matilde era uma vaca sem sal e a prova estava ali diante dos meus olhos, dentro da sala onde me tinha entregue aquele homem, na esperança de vir a ter uma família, filhos… etc, etc, etc…
                Não rompi em histerias, nem tão pouco falei. Simplesmente voltei costas e desci às urgências, onde a minha amiga, a única pessoa que nunca me trairia aguardava-me.
                As lágrimas não vieram, a raiva desapareceu e eu foquei toda a minha força, toda a minha atenção na minha amiga, que no espaço de tempo em que eu recebia a minha terceira estalada amorosa tinha recuperado a consciência e estava tão desnorteada quanto eu. Mas eu tinha que cuidar dela, para que depois, quando a tempestade de nome traição se abatesse sobre mim, ela tivesse força suficiente para me amparar e recuperar os cacos perdidos do meu coração.
                Quando a médica das urgências deu alta medica a Diana, apressei-me a chamar um táxi para nos levar a casa. A casa dela, já que não me atrevia a ficar sozinha pois sabia que quando o fizesse, quando não tivesse nada com que me entreter e manter-me ocupada, o sabor da traição envolver-me e destronar-me-ia, sem dó em piedade. Diana perguntou-me o que eu tinha, visto estar com um aspecto piro que o dela, e eu, cobarde, usei a desculpa da intoxicação para me livra de um interrogatório. No entanto, mesmo tendo passado por um ma bocado, ela sabia que lhe estava a mentir.
                - Algo de grave se passa e podes esquecer o maldito Sushi como resposta. – disse ela enquanto se aconchegava num dos lados da cama – Mas amanha, não me escapas. Quero saber o que aconteceu.
                Eu engoli em seco e anui com a cabeça. Não valia a pena tocar naquela merda de assunto aquela hora da noite.
                Não consegui pregar olho e só consegui pensar na espécie de pessoa que eu devia ter sido numa outra vida porque só podia ser mesmo uma pessoa terrível, para levar cm um azar daqueles. Aquilo não era normal. Três relações falhadas. Três traições. Três desgostos, um a seguir ao outro. Um pior que o outro.Não, alguma coisa não estava bem. Alguma coisa não batia certo. Era bruxedo. Tinham-lhe rogado um feitiço, uma praga qualquer coisa. Só podia. Ninguém tinha tanto azar.
                Diana mexeu-se na cama e quando dei conta, tinha aqueles enormes olhos castanhos presos em mim.
                - Já acordada? – perguntei, atrapalhada, a limpar as lágrimas que finalmente me brindavam com a sua presença.
                - Vais dizer-me o que se passa e é agora. Vá, Eloisa, o que foi, conta-me. Sem rodeios! – exigiu a minha amiga, com cara de sono, olheiras profundas, maquilhagem por remover e cabelo despenteado.
                Não aguentei e entre fungadelas e soluços choros contei-lhe a cena sexual com que Gil me brindara na madrugada passada, quando mais eu precisava dele. Mas o piro foi quando toquei no nome da Matilde. Diana explodiu, e se até à data detestava a miúda, agora odiava-a de morte.
                Quando parei de chorar e me recompus, também Diana estava mais calma. Peguei nas minhas coisas quando o táxi chegou.
                - Promete que não lhe vais fazer nada? – pedi.
                - Não percebo… - Diana rangeu os dentes indignada.
                - Eles não merecem que,…
             - Não amiga, quem não merece és tu. – Di, bufou exasperada – Mas ok. Não vou à procura dela…
                Beijei Diana no rosto, pedi-lhe que descansasse e regressei a minha casa.

                Não posso dizer que foi fácil, ultrapassar o choque. Mas também não foi difícil, nem foi de ficar a querer morrer no sofá. Segui a minha vida. Levantei a minha cabeça e avancei com a minha vida. De que me adiantava ficar a chorar no sofá? De nada para além de ganhar uma dor de cabeça e ficar com os olhos tão inchados como se eles me fossem saltar da cara. Não, já lá tinha ido o tempo em que isso acontecia.
                Dediquei-me ao trabalho e foi precisamente numa das minhas tardes de trabalho, que Gil apareceu por lá. Não me engasguei por muito pouco. Ele pediu para falar comigo e eu cedi. Não porque quisesse falar com ele, mas porque não queria escândalos no meu local de trabalho.
                Sentámos numa mesa do bar e ele sorriu-me. Bandido. Apetecia-me bater-lhe!
                - 'Tás bem. Quero dizer, pareces-me bem!
Eu ri-me, de uma forma totalmente descontrolada. Quando recuperei, tinha-o a olhar para mim de boca aberta.
                - O que foi, meu querido? – disse com sarcasmo – Achavas o quê? Que ia ficar em casa, trancada, a chorar por ti? Desculpa amor, mas essa fase já passou. E se era isso que querias, lamento, mas estás a perder o teu tempo…
Levantei-me e preparei-me para me afastar da mesa, quando ele me agarrou o braço.
                - Espera. Não foi isso… é que… Bolas, devo-te um pedido de desculpa. – disse ele – A sério. Não foi por mal.
                - O quê? Não foi por mal? Mas estás a brincar comigo?!
                - Deixa-me explicar. Por favor, ouve-me… Eu… Eu… Caraças, Eloisa… eu tenho um problema. – confessou.
                - Ah sim, tens um problema? Azar, meu querido, resolve-o. Deixou der ser um problema meu.
                - Eu não consigo resistir às mulheres. Eu amo-te Eloisa, mas não consigo passar só contigo. – disse ele.
                - Bom, como disse, azar o teu. Deixou de me dizer respeito. Passa bem, Gil.
                Rodei os calcanhares e avancei pelo pátio quando o voltei a ouvir:
                - Se assim é, porque deste uma tareia na Matilde?
Rodei sobre mim mesma, completamente perplexa.
                - Eu o quê? Eu fiz o quê?
Ele levantou-se e veio na minha direcção. Enfiou as mãos nos bolsos e olhou-me com uma espécie de brilho orgulhoso nos olhos.
                - Ela chegou ao hospital com a cara toda vermelha. Arranhada no pescoço, nos braços, por todo o lado. Um olho negro. Não foste tu?
A minha perplexidade falou por mim.
                - Não foste tu. – constatou ao fim de uns segundos.
                - Claro que não fui eu. – disse-lhe quase chateada – Mas já desconfio quem foi.
                Gil acenou com a cabeça e teve a decência de sair do meu local de trabalho sem me dirigir mais nenhuma palavra. Eu, por minha vez, senti-me triunfante. Não tinha descido ao nível dele, tinha conseguido controlar-me e dei por mim a sorrir, para logo de seguida cerrar os olhos e correr em busca do meu telemóvel. Diana devia-me uma explicação.
                - Tu prometes-te. – Disse-lhe, à laia de cumprimento.
                - Eu prometi que não a procurava. Não o fiz. – Disse ela, como se me estivesse a dizer que o sol é amarelo. – Mas não te prometi que me conteria caso ela se atravessasse no meu caminho.
                - Diana, podes vir a ter problemas. Não vale a pena. – Ralhei. Ela era maluca e um dia ainda pagava caro por isso.
                - Não me importa. Quem se mete com os meus, mete-se comigo. Além disso, deu-me um gozo enorme, poder arranhar aquela cara sonsa.
                - És doida… Mas adoro-te. És uma boa amiga, sabias? – Disse, a tentar controlar as lágrimas.

***



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