Boa Noite Estrelinhas,
Desculpem só agora dar o ar da minha graça, mas fui raptada!!!! Por criaturinhas cor de rosa com bolinhas amarelas e risquinhas azuis...deveras assustador!!!
Para compensar.... uma ENTREVISTA!! Ao escritor Português, Manuel Alves, que apresentei aqui, no Nacionalmente Bom 2
Ora conheçam então o nosso autor!
1º Manuel
podes falar um pouco de ti, o que fazes, o que gostas e detestas.
Olá. Resumindo, posso dizer que nasci e tenho-me
aguentado. Apesar das várias tentativas de assassinato da parte do Universo. Já
escapei a uma asfixia (idiotices de crianças), a afogamento (duas vezes…
aprendi a nadar um bocado tarde… mas não demasiado, felizmente), a um acidente
de viação (capotar é divertido, mas não recomendo que se faça de propósito), e
vou fazendo fintas às rasteiras da vida em geral. De resto, isto de estar vivo,
e poder aproveitar um bocadinho as sortes que nos calham, é fixola.
O que faço? Bem… sou ilustrador, quando tenho
trabalho, e sou escritor, quando não tenho. Mas é costume uma coisa meter-se no
caminho da outra. Ciúmes, e isso. Quando a ilustração e a escrita chegam a um
acordo, felicidade e harmonia. Gosto de tangerinas descascadas ao fim da tarde,
sentado numa cadeira aquecida pelo sol, a apreciar a lentidão da vida durante o
Verão. Detesto que o Verão esteja a tornar-se uma criatura mitológica com
avistamentos raros. E nabo, naturalmente. Detesto nabo.
2º Uma vez
que vamos falar de livros, de que género literário gostas?
Gosto de livros que me fazem gostar de ler. O
género literário não é factor decisivo na escolha, no sentido em que posso
passar os olhos por vários livros de um determinado género e acabar por
escolher um de outro, para leitura integral. Mas, se for para responder sobre
quais os géneros literários que mais leio, são (sem nenhuma ordem de
importância): ficção literária, fantasia e ficção científica.
3º Algum
autor preferido? Porquê?
Como leio livros, e não autores, as minhas
preferências não se prendem com a proveniência das palavras que mas sim com o efeito
que a leitura tem em mim. Por melhor que cada um seja naquilo que faz, ninguém
é absolutamente constante na capacidade de o fazer, e o autor que pode
agradar-nos num livro pode igualmente desagradar-nos em outro. Parece-me mais
sensato dizer que há livros que me divertiram bastante, na altura em que os li
(alguns dos quais, agora, talvez não tivessem o mesmo efeito). O prazer da
leitura é, como tudo em geral, relativo. Aproveita-se enquanto dura, e é o
melhor que se pode esperar do que quer que seja.
4º O que te
motivou a escrever?
Há quem diga que sou um espírito contemplativo e,
se isso é verdade, suponho que cria a necessidade de capturar o resultado da
contemplação em invólucro menos fugaz do que o pensamento dedicado ao momento.
A escrita é a memória perene das coisas. Pelo menos, enquanto durar. É
certamente mais fiável do que a minha memória. Quantas vezes, durante o dia,
surgem pensamentos sublimes (sempre sublimes, claro) que serão apagados para
sempre (talvez) se não forem registados. É um tormento aceitar que as ideias
vêm até nós apenas para existirem a brevidade de um instante. Não se pode
escrever tudo, naturalmente. E talvez nem se deva. Mas há ideias que merecem
vida longa e partilhada. A escrita é (também) isso. Escrever é uma fome de
espírito, uma sede de coração. É descobrir e partilhar as descobertas. É uma
das vias extraordinárias que os seres humanos criaram para se expressar e ser
entendidos entre os semelhantes. Se bem que, às vezes, é uma via que complica
as coisas no esforço irónico de as simplificar. Não há sistemas perfeitos e,
diga-se, os seres humanos são criaturas de entendimento complicado. Hum… qual
era mesmo a pergunta?
5º Das 12
obras que já tens ao acesso dos leitores, qual é, para ti, o teu menino? E
porquê?
O meu menino lindo é (capaz de ser) “A invenção
de um conto de fadas”. É o primeiro romance publicado. Escrevi o livro para
tentar mostrar a uma pessoa que uma relação não tem de acabar apenas porque se
altera. As pessoas podem ser amigas quando não há razão sensata para não serem.
Há circunstâncias em que as relações que se querem não são possíveis apesar da
vontade de ambas as partes. A vida não transforma mundos inteiros, da noite
para o dia, apenas porque as vontades querem. Ainda bem e ainda mal, que é
assim. É o estado das coisas. Então, escrevi o livro para falar dos afectos nas
cinco fases da vida (divisão minha, sem qualquer pretensão científica):
infância, adolescência, vida (jovem) adulta, meia-idade e terceira idade.
Gostaria que a vida tivesse tido um bocadinho mais de paciência para me deixar
acabar o livro a tempo de essa pessoa o ler, quando a leitura poderia fazer a
diferença. Não sei se essa pessoa leu o livro ou se alguma vez lerá. Mistérios
que temos de aceitar até ao momento em que talvez tenhamos a sorte de descobrir
as respostas.
6º As tuas
obras vão desde Ficção Cientifica a Romance, dando ao leitor vários géneros de
literatura. Para ti, há algum tema que seja mais difícil ou fácil de escrever?
Para mim, é fácil escrever. Talvez o termo mais
indicado seja natural, porque chegar
ao fácil dá muito trabalho (o que,
vendo bem, não significa que seja difícil). O que faço é adequar o registo de
escrita à história que pretendo contar. Não penso muito em qual género
literário se incluirá. Deixo essas considerações para quem entender fazê-las e
tenha maior conhecimento do que o meu, nessa área. Naturalmente o meu estilo
próprio (se é que tenho um) acaba por passar para tudo o que escrevo, seja qual
for o género, mas a escrita molda-se consoante a história, tal como o nosso
discurso quando falamos para pessoas diferentes. Conheço pessoas que se movem
em contextos culturais distintos, e seria complicado se falasse para todas da
mesma maneira. Não é, numa visão simplista, usar palavras caras para umas e
vocabulário reduzido para outras; é adequar o meio de comunicação à mensagem
que pretendemos transmitir aos destinatários em questão. Uma não é (nem deve
ser) melhor ou pior do que a outra, é apenas a adequada ao objectivo em mente.
Considerações técnicas à parte, consigo escrever o que quer que seja acerca do
que quer que seja. Depois, as palavras agradarão a quem quer que seja, como
quer que seja (não vamos falar de possibilidades negativas). Se é para falar de
coisas difíceis (ou que, pelo menos, dão mesmo muito trabalho), falemos de
revisão. Mas não agora. Dá muito trabalho.
7º Há
alguma obra a caminho? Podes falar-nos sobre ela?
Estou (quase, quase, mas mesmo quase) na fase
final da reescrita/revisão de um manuscrito antigo que decidi ressuscitar. E ressuscitar é o termo adequado, porque o
livro também aborda a ideia de que a morte não é um fim definitivo. Terá como
título “A Cativa”, e será o primeiro volume de “Wulfric”, uma série de fantasia
que se alongará, pelo menos, por quatro livros. O personagem central é Wulfric,
um dos Mestres da Ordem, uma organização milenar secreta (naturalmente), que
assegura a manutenção, na Terra, do equilíbrio de poderes entre os Lados (Céu e
Inferno). Se tiver de enquadrar a série em géneros literários, direi que tem
por base a fantasia urbana (ou isso), com ramificações para romance, terror,
ficção científica, e até ficção histórica. A história está ancorada no
presente, mas há partes da acção no passado (Wulfric é muito antigo), algumas
em Portugal, durante o cerco da cidade do Porto, na guerra entre Liberais e
Absolutistas. Num dos livros da série, parte da acção poderá mesmo passar-se no
futuro. Mas, isso, só mesmo o futuro o dirá. No primeiro livro, aparecem
lobisomens, fadas, anjos, demónios, Lúcifer, Mefistófeles, uma feiticeira que
guarda a cruz de Cristo, Cativas (é preferível ler o livro do que perguntar-me
o que são) e, claro, Wulfric, o Mestre Lobo. O grande problema que ele terá de
enfrentar no primeiro livro é a questão do desentendimento entre Lúcifer e
Mefistófeles, uma ameaça considerável para a manutenção do equilíbrio entre os
Lados.
8º Das tuas
obras, qual seria a primeira a recomendar?
As minhas recomendações são as sinopses. Os
leitores que as leiam e decidam. Procuro ser o mais honesto possível na
exposição daquilo que poderão esperar das respectivas histórias. Se é algo
sempre feito com sucesso, é difícil (sobretudo, para mim) avaliar. Novamente,
deixo ao critério dos leitores. Não vou dizer que todos os meus livros são como
filhos (porque é uma comparação absurda e um bocado aldrabona), e que gosto de
todos de maneira igual. Tenho carinho especial por alguns, e eles
compreendem-me (ahah), porque mesmo os livros menos acarinhados recebem afecto
em abundância. Talvez possa fazer umas sugestões. O “Z” foi, de certa forma, o
tiro de partida para a publicação. É um conto de ficção científica centrado em
dois personagens dotados de intelectos superiores, e aparentemente antagonistas.
Z, um jovem gerado num útero artificial, e o Professor, o cientista que o
criou. É gratuito e está disponível para quem quiser conhecer as razões de
ambos os personagens. Para quem gostar de fantasia para crianças que é, na
verdade, para miúdos e graúdos, arrisco garantir que gostará de conhecer a
“Lili”. Houve quem a comparasse a “Coraline”, de Neil Gaiman, algo que me
parece que deixaria o Neil Gaiman contente (ahah). Também compararam, em parte,
a “O Estranho Mundo de Jack”, de Tim Burton. Mais uma comparação feliz,
portanto. É uma série de contos ilustrados, com dois livros já publicados e o
primeiro é gratuito. Para além do já mencionado “A invenção de um conto de
fadas”, tenho de incluir o meu romance mais recente “Terra Fria”, uma história
que recua aos tempos da ditadura salazarista, altura privilegiada para encontrar
nas pessoas o pior e, felizmente, também o melhor da humanidade. Para quem ler
e gostar de um destes livros é quase certo (mas não garantido) que poderá
gostar de qualquer um dos outros mencionados.
9º O Que
achas mais difícil, quando se é escritor em Portugal?
Ser escritor em Portugal (ahah… rir para não
chorar). Para sermos justos, suponho que é sensato concluir que é difícil ser
escritor em qualquer país. Mas, em Portugal, algumas dificuldades agravam-se.
Para começar, presumindo que se escreve em português, o escritor está confinado
(no sentido comercial) a uma língua que não pertence ao grupo muito reservado
das que dominam o mercado editorial a nível mundial. Hoje em dia, é bom que
consideremos as coisas globais dentro da sua verdadeira escala. A internet
possibilita a publicação de ebooks em todo o mundo. Segundo os dados de que
disponho, desde o início do ano, os meus livros foram adquiridos em, pelo
menos, 17 países, a grande maioria dos quais não tem o português como língua
oficial. Deve ser mesmo verdade que há portugueses em todos os cantos do mundo.
A propósito, acho que está na altura de se começar a usar a expressão “curvas
do mundo”. Afinal, já passaram alguns séculos desde que se estabeleceu que a
Terra não é plana e que, tecnicamente, não tem cantos. É só uma ideia. Voltando
ao assunto… Em Portugal, segundo aquilo que me é dado perceber, os leitores a
sério lêem muito e compram livros sempre que podem. O problema é que não há
muitos leitores a sério. Não vou dizer que compreendo as razões da escassez de
leitores que folheiam, vá lá, um livro por mês (já não seria mau, se fosse o
mínimo dos mínimos), e duvido que alguém compreenda inteiramente. Em Portugal,
não há cultura de protecção da cultura (redundância intencional). Não se trata
de obrigar todos a ler, porque todos devam forçosamente ler, trata-se de criar
as condições para que todos os que queiram fazê-lo de livre vontade possam ler
sem, por exemplo, se verem obrigados a escolher entre comprar um livro ou pão
para o mês inteiro. Em grande parte, é essencialmente um problema de educação
cultural. Nem todos têm de gostar de ler (os gostos deverão ser, por definição,
espontâneos), mas os que gostam (e os que poderiam gostar, se lhes fosse
permitido) deviam poder usufruir de uma estrutura institucional que lhes
facultasse o acesso aos livros. Estado Português, queres comentar?
(…)
Pois, a cobardia silenciosa do costume. Para
completar o par de sapatos de cimento que afundam o desafortunado escritor
português nas águas editoriais, lá estão também as editoras a fazer peso. Não
vou debater a necessidade óbvia de as empresas terem de gerar receitas para
serem viáveis financeiramente. Ponto. Mas o facto é que, cada vez mais, as
editoras jogam pelo seguro e publicam autores maioritariamente estrangeiros,
com garantias relativas de sucesso, em virtude das vendas internacionais, e
fecham-se para as apostas em autores portugueses emergentes que, dentro do
território nacional, poderão ser igualmente rentáveis. Não pretendo, de modo
algum, afirmar que se dê oportunidade aos autores nacionais apenas porque são
de cá, e escrevem em português. Há que publicar autores estrangeiros que
merecem ser lidos, e há que dar trabalho a tradutores que, como os escritores,
precisam de comer. O que pretendo afirmar é que se dê oportunidade, ponto
final. Para colocar as coisas em perspectiva, comecei a publicar há menos de
dois anos (um completo desconhecido dos leitores, na altura) e, até ao momento,
o número de aquisição dos meus livros ronda os 30 mil. Uma pena
(financeiramente), que a maioria se deva a downloads gratuitos mas, ainda
assim, é válido levantar uma pergunta. Quantos autores nacionais, nos últimos
dois anos, conseguiram fazer chegar às mãos dos leitores 30 mil livros? Mesmo
sem saber números concretos, arrisco que não serão muitos (alguém me corrija,
se o palpite for ao lado), principalmente se começaram a publicar há menos de
dois anos. É caso para se dizer que, afinal, a coisa (para mim) até nem está
muito mal em Portugal, certo? Bem, não vamos deitar foguetes antes da festa. A
grande maioria dos meus leitores vive no Brasil. Abençoada existência de outros
países falantes de português. Só para terminar a questão, mais uma coisinha.
Nos últimos tempos, dois dos maiores grupos editoriais de Portugal começaram
(aparentemente) a apostar em plataformas de autopublicação, para dar
oportunidade aos novos escritores e tudo muito bonitinho embrulhado com
lacinho. Acontece que as oportunidades maiores são, claro está, para as
próprias editoras, que colocam os livros (ebooks) a
preços demasiado elevados para autores desconhecidos (sejamos sensatos) e,
desses valores, reservam margens ridículas de ganho para os autores, em
comparação às oferecidas por exemplo, pelo Smashwords, a editora dos meus
livros. Para fazer um pequeno teste (porque eu sou um malandreco, admito),
enviei para uma dessas editoras os manuscritos dos meus dois romances já
publicados. Passado mais ou menos o tempo indicado para a resposta prevista,
recebi um email a elogiar os dois livros, afirmação explícita de que apreciaram
“sobremaneira” (estou a citar) a qualidade da escrita, mas que era uma pena
verificarem que os livros já se encontravam publicados, condição que
inviabilizava a publicação pela editora (algo que eu já sabia através da
leitura do regulamento, pois claro). Fizeram questão de reiterar os elogios e
manifestaram o desejo de que eu contactasse a editora em relação a futuros
trabalhos. Certo. Uma pergunta. Afinal, qual o impedimento em dar uma
oportunidade de facto e celebrar um contrato para a publicação física? Não
seria o primeiro autor a mudar de editora. Posso apenas presumir que, todos os
dias, recebem de cada autor aos dois livros que consideram excelentes, prova
verificada da qualidade da escrita que se mantém de um livro para outro. Dito
isto, espero que os autores que beneficiam dessa tal oportunidade, e similares,
tirem o devido (justo) proveito do seu trabalho.
10º O que
aconselhas aos novos escritores, que mantêm o manuscrito na gaveta?
Nem tudo o que se escreve merece ser publicado. É
bom que se avalie a realidade e se ponha o ego de lado. Há manuscritos que
servem apenas (e não é pouco) como treino de escrita. Eu comecei a publicar há
menos de dois anos, mas escrevo há uns vinte. Portanto, em contas simples,
treinei uns dezoito anos para saber que manuscritos tirar da gaveta. E todos os
anos de treino que ainda tiver pela frente (a vida inteira) servirão para refinar
os critérios da frieza que permite identificar os manuscritos que nunca deverão
sair da gaveta. Uma boa parte de ser escritor é, em medida igual, saber o que
publicar e não publicar. De resto, dito com a maior simplicidade possível,
escrevei, pá. Bom e mau, tudo é experiência. Mas se a intenção é publicar, lá
terá de vir o momento em que a gaveta já não pode conter mais páginas e apenas
o mundo é grande o suficiente para permitir a existência das palavras. É
escrever o fim, deixá-lo partir ao encontro dos leitores e escrever o início do
próximo livro. Há que preencher o espaço vazio na gaveta.
Muito Obrigada ao Manuel, pela atenção e disponibilidade para esta pequena entrevista.
Em breve, assim que possivel trarei noticias sobre “A Cativa”
Mas que entrevista espectacular. :D
ResponderEliminarVou espalhá-la por essas virtualidades fora.
Está mesmo, tenho de concordar hehe
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