quarta-feira, junho 26, 2019

Diário de uma Maça com bichinho #3

Esta rubrica era para ter acontecido durante o decorrer da minha gravidez, infelizmente tal não foi possível.

A gravidez não correu como esperado e tal como alguns de vocês sabem, foi desde o repouso as dores extremas e internamento e idas constantes as Urgências de Obstetrícia.  

Esta gravidez, quase que poderia ser um filme de terror, isto sem falar do parto. Depois de tudo o que se passou, decidi fazer reclamação. Enviei carta para a ordem dos médicos, para o Ministério da Saúde e sei lá que mais. As respostas foram todas idênticas, passando assim eu a ser a mentirosa da equação. Sinto-me revoltada e furiosa, pois ainda hoje, dia 24 de Junho, não me sinto recuperada, muito menos ainda bem. Se alguém fez alguma coisa? Obviamente que não. Mas vamos começar pelo inicio, e convido a sentaram-se pegarem numa caneca de café e lerem tudo.

Existem N noticias sobre gravidez, mortes na gravidez e/ou partos. Estudos mal feitos, informação enganosa e obviamente, a culpa é sempre nossa!

Vejamos... ver noticia na integra AQUI

" Em 2017 morreram nove mulheres, em 86,154 nascimentos, durante a gravidez ou o parto e os médicos apontam a gravidez tardia como uma das principais causas."

Gravidez tardia? Eu aponto para a falta de respeito, a violência que uma grávida / parturiente sofre e que NINGUÉM quer saber.
Desde o péssimo acompanhamento que o grávida tem até ao parto é um pesadelo! 

E se a grávida tiver problemas de saúde e a gravidez seja de risco? O tratamento é o mesmo se não pior! 

Vamos então à minha história, uma história verídica e na qual passei por mentirosa, uma história completamente real e que  quase me mataram a mim e a minha bebe. Fui ignorada, mal vigiada e vingaram-se de mim.

A 18 de Dezembro de 2018 dou entrada no serviço de urgência de obstetrícia no Hospital São Bernardo com fortes dores/ ardor abdominal, tonturas, enjoo e a sensação de que iria desmaiar, acabei por saber que estava grávida, apesar de fazer o meu método contraceptivo e não menstruar a mais de 7 meses.

No dia 20 de Dezembro tenho consulta com a minha médica de família e a mesma tendo em conta o meu historial encaminha-me para o HSB, para ser seguida.
 
A 30 de Dezembro volto a dar entrada nas urgências novamente com dor / ardor abdominal e perdas de sangue a onde me foi "diagnosticada" uma ferida no colo do útero e a recomendação de repouso, sendo a gravidez considerada de risco elevado.

A 8 de Janeiro volto a ter mais uma consulta com a minha MF para vigilância da gravidez.

No dia 1 de Fevereiro tenho finalmente consulta com o obstetra que deveria seguir a minha gravidez. O Dr. R. contudo, na carta para a consulta eu deveria de estar nas consultas externas as 8 da manha, assim foi, podem as 9:30 ainda nada do médico. Nada de mais, só que minutos depois de ter chegado comecei a sentir-me mal, sem posição para estar, fortes dores nas costas e no fundo da barriga, calores e frios e enjoo. As lágrimas já me corriam pelo rosto e a auxiliar trouxe uma cadeira de rodas e encaminhou-me para a obstetrícia. Diagnostico... Infecção Urinaria, vim com antibiótico para casa, contudo voltei a passar pelas consultas externas, com a preocupação de que teria de remarcar nova consulta, consegui falar com o Dr. R e fiquei super contente por isso, confesso que foi uma "consulta" me3ga rápida mas tendo em conta que eu estava fora de horas já.. nessa consulta foi pedido uma eco 2 trimestre. 
Ecografia essa feita a 27 de Fevereiro e que o Dr. VG pede repetição da mesma mais ou menos dentro de 4 semanas.

[estão atentos e apontar tudo?]

Finalmente a 1 de Março tenho a minha tão esperada consulta. Consulta essa que irei falar sobre o meu Crohn, sobre estar a fazer biológicos e
imunossupressores e o facto de não poder de forma alguma fazer ferro via oral. Ou seja uma lista longa mas necessária para que o Crohn se mantenha controlado e uma gravidez sem problemas.
Mas ao chegar a sala de espera as 8:30, a auxiliar questiona-me o que faço eu ali... dei um risozinho e pensei, a mulher anda perdida coitada... mas não... ela foi a lista que tem das consultas e informa-me que a minha consulta era as 16 da tarde. E eu confusa, nego, e digo que não estava as 8:30, que até podia ir ao balcão de novo pedir a folha e mostrar. O Dr. R tinha riscado a hora e posto outra, a das 8:30. Muito constrangida a auxiliar foi averiguar o que realmente se passava e por acaso, cruza-se com o Dr. que estava de serviço nas urgências e que este lhe tinha dito [palavras da auxiliar] que nem sabia que tinha consultas da parte da tarde. No entanto eu deveria fazer a consulta com a enfermeira e depois ir ter com ele as urgências. 
Tudo muito bem, fui fazer a ficha para a enfermagem e quando já estava com a enfermeira a ter consulta eis que entra o medico todo muito apressado... diz que não é necessário a consulta de enfermagem, há uma discussão entre eles e o médico responsabiliza-se a medir pensão e tudo aquilo que ela teria de fazer. Contudo foi uma consulta ainda mais rápida que a primeira.
Escusado será dizer que ele não mediu tensão e não fez nada do que disse que faria. Apenas olhou para a ecografia disse que estava tudo bem e não havia nada a preocupar. Falei do Crohn, desvalorizou, falei por causa do ferro, ignorou completamente. Passou umas analises e a prova da glicose e nada mais, nada de repetição de ecografia nem nada. Passou uma receita que incluía ferro, insisti que não podia fazer oral devido ao meu problema de saúde, bati o pé e ele lá passou Iodeto de Potassio - Yodafar [ medicação que já estava a fazer] e complexo hidroxido ferrico-polimaltose - Maltofer  375mg / 5ml [ampolas ] o que mencionei que não podia tomar...mas ignorou.

Nesse mesmo dia recebo uma chamada do hospital, era a enfermeira a pedir para ir lá no dia seguinte - ou seja dia 2 de Março - que era para concluir a minha consulta de enfermagem porque ela sabia que o médico não a tinha feito como assegurou que o fazia.

A 19 de Março dou nova entrada de urgência e se não me engano nesse dia é-me diagnosticado ciática, pois queixava-me com dores no fundo da barriga, fortes dores nas costas que me  apanhavam a perna direita e a vagina, sentido nesta uma pressão de dentro para fora.

A 27 de glicose não é efectuada pois os resultados em jejum já estavam ligeiramente acima do indicado e uma vez que tinha consulta no dia 10 de Maio acabei por ter de recorrer a minha MF e foi a mesma que pediu a repetição da tal eco que o Dr. R nunca a pediu.

No dia 12 de Abril tinha a minha consulta de diabetes e gravidez - metabólica, contudo uma vez mais passei mal, fortes dores abdominais e nas costas. a enfermeira que me estava a fazer a consulta acabou por me dizer para ir as urgências, porque dores abdominais não é bom. Mas fiz as consultas, estive com a nutricionista, no qual me enervou logo. Eu tenho o meu Crohn à 17 anos, sei muito bem o que posso e não posso comer. expliquei isso, mas segundo ela [nutricionista] eu não tinha qualquer intolerância alimentar, o que acontecia era que eu não comia os alimentos e o intestino não tinha defesas depois para as combater, que eu tinha de comer favas, feijão, lentilhas, couves e afins para o meu intestino criar defesas... enquanto isso eu ficava de diarreia até começar com as hemorragias, era bem bonito.

Quando terminei as consultas, dirigir-me as urgências e fiquei logo internada, pois estava com contracções!Na altura estava de 27s+1d e tive alta a 21 de Abril. Nessa nota de alta vinha referido que deveria ser observada ao fim de 1semana e meia. Tendo em conta que tinha consulta no dia 10 de maio, fiquei descansada. 

Enquanto estive internada, foi-me dado a alimentação que a nutricionista prescreveu, escusado será dizer que não correu bem. Ao contrario do esperado, não tive diarreias, mas sim prisão de ventre e tive de ligar ao meu medico de gastro e explicar o que estava a acontecer... tive de tomar laxante. 

A 10 de Maio as 12:30 seria então a minha consulta com o Dr. R, porém essa consulta nunca se realizou devido à greve dos médicos. Nem nunca cheguei a receber nenhuma remarcação da mesma. Muito mais tarde tive a confirmação dada pelo próprio médico que NUNCA a remarcaram, portanto não houve qualquer extravio da carta.

Um dos temas que ainda consegui falar com o Dr. R, na ultima consulta, foi o facto do meu Diogo ter nascido de 37+4 dias e de que eu receava que o mesmo acontecesse com a minha Leonor, ele descartou essa hipótese e de que a menina nasceria a 11 de Julho, dia em que eu completaria as 40semanas e que essa seria a nossa próxima consulta, após esta do dia 10 de Maio.

A 21 de Maio dou novamente entrada de urgência. Não me recordo bem se foi neste dia que me disseram que estava com uma crise de apendicite ou se era mais uma infecção urinária..



A 4 de Junho dou entrada nas urgências com contracções e é-me recomendado repouso [mais? mas já passou 24 sobre 24 horas de cama ]

A 7 de  Junho torno a voltar as urgências, dor/ ardor abdominal e fortes dores nas costas com dificuldades em manter-me em pé e a andar.  Primeiro é colocado a hipotese de ser o Crohn e depois é reforçado a ideia de uma infecção urinaria, porem confesso que não me recordo de ter feito alguma analise *sarcasmo* mais contracções.Nesta altura do campeonato eu estava super hiper mega inchada, os pés então nem se fala e mal consegui andar por isso, mais as dores na zona dos rins, ancas, vagina [pressão] e coxas [ossos].

A 11 de Junho a minha MF passa uma carta com urgência para a obstetrícia, motivos, tensão alta, muitíssimo inchada [mãos, pés, pernas, rosto] e dores por todo o corpo, muita dificuldade em andar e manter-me de pé.


A 13 de Junho dou entrada nas urgências com os mesmos sintomas e acrescentado ligeira perda de sangue misturado com um género de ranhoca. Como sempre nada é feito pois a bebe está bem e não há qualquer perigo para a mesma e por essa razão sou enviada novamente para casa. E quem me atende nesse dia é nada mais nada menos que o obstetra que deveria de estar a seguir a minha gravidez. Qual o meu espanto quando o mesmo me pergunta se sou seguida no hospital, respondo que sim e que é ele o obstetra que deveria de vigiar a minha gravidez, protesto pela falta de vigilância e de que não tive consulta no dia 10 de Maio e que nunca foi remarcada qualquer outra consulta. Isto com um sorriso no rosto, o Dr. R passa um papel para as minhas mão onde diz para ir lá no dia seguinte as onze da manhã que ele faria a consulta.

No dia 14 de Junho, há hora marcada, chego ao serviço de Obstetrícia para me encontrar com o Dr. R tal como combinado... O Dr. faltou!!!! Senti, naquele momento, vontade de chorar, gritar e espernear! 
Eu não andava bem, não me sentia bem e ele medico, o médico que dizem ser um excelente médico, maravilhoso e 5 estrelas andava a brincar comigo!! 
Cansada e saturada de toda a situação exigi ser vista por um médico ou apresentaria queixa. Deveria ter apresentado logo a queixa, fiz mal em não o ter feito. Fui vista pelo Dr. V que é o médico que fez todas as minhas ecografias, um médico super atencioso e simpático, expliquei o que se estava a passar. Dentro do possível o Dr. tentou encaminhar-me para uma consulta de obstetrícia com MUITA URGÊNCIA e uma vez que era diabética gestacional, pediu também uma consulta com o pedido de URGENTE [ consultas essas que nunca chegaram]

Nesta altura já me encontrava gravida de 36semanas.

No papel que imprimi no site do SNS a declaração que comprova que estive nas urgências é com a data de  19 de Junho as 01:53 [ hora que saí - provavelmente deve de referir-se ao dia que entrei e não a hora que sai...confuso e estranho porém o registo que tenho [facebook] é de 20 de Junho, quando aconteceu o mais insólito das situações!
dou entrada novamente nas urgências, fortes dores abdominais e nas costas, barriga dura e dificuldades em respirar. Foi feito um CTG a onde acusa contracções, porém não estou em trabalho de parto, é-me dado injecções para as dores e afins e depois é dada alta - porque segundo a medica de serviço - não havia camas nem médicos suficientes para internamento.  Se por ventura me sentir pior, que devo dirigir-me as Urgências ao Hospital do Barreiro.

De madrugada começo a piorar de novo com as dores, vou para o hospital do barreiro no entanto e após fazer CTG é dado alta e que devo  regressar ao hospital de Setúbal e sou aconselhada a chamar o director da obstetrícia, explicar o que se passa e exigir atendimento.

Faço o que me dizem e por volta das 9 horas da manhã estou de novo no HSB. Peço para ser vista pelo director da obstetrícia, mas é-me dito que o mesmo não se encontra no hospital mas que o chefe de serviço irá ver-me. Assim que o médico me vê e pede-me para o acompanhar, explico tudo desde o inicio do que se está a passar e que trazia comigo uma carta do meu médico de Gastro. O Dr. AC, o mesmo diz para fazer ficha e aguardar que ele iria pedir a um colega que me visse.

É pedido novo CTG que acusa contracções, contudo uma vez mais não estou em trabalho de parto. A médica que entretanto me atendeu aconselha a ir a casa almoçar e andar muito e voltar por volta das 15horas para reavaliação.

Quando o meu espanto quando vejo o Dr. AC com o obstetra que deveria seguir-me, o Dr. R na galhofa, o mesmo dirige-se a mim e notei aquele riso cínico e ainda pergunta em tom de gozo, então não tem vindo as consultas? No qual respondi, eu venho, o Dr. é que não.

Novamente o Dr. R pede para eu vir no dia seguinte, dia 21 de Junho, pergunto a ele se ele irá mesmo comparecer ou se eu irei chegar e ele não está. Ele ri-se e diz que sim, estará, se não estiver ele estará uma colega dele e que a situação será resolvida. Dito isto vira costas e vai embora.

Dia 21 de Junho dou entrada novamente no serviço, contudo não é o Dr. R que me atende, mas sim uma médica e é ela que faz o meu internamento após ler a carta do meu médico de Gastro.

Por volta das 16:40 do mesmo dia recebo no meu telemóvel uma sms da Affidea Caselas a confirmar agendamento de RM a realizar no dia 26 Junho as 10:45. Questionei se poderia fazer esta RM, porém ninguem me respondeu.


A 22 de Junho sou informada de que irei fazer eco e por volta das 11 da manhã sensivelmente é provocado o parto uma vez que estou com pré-eclampsia, sou doente de Crohn e tenho Diabetes Gestacional. Momentos mais tarde faço uma reacção alérgica, falta de ar e ataque de tosse bem forte, onde depois me colocam oxigénio. Quanto a dilatação, uns médico dizem que está a 3 outro a 5 e vá de ser um enfiar dedos que pouco faltou para me sentir um túnel, já me doía tudo, ainda mais se possível.

Um ponto interessante e que não percebo o porque de tratamentos diferentes é... duas gravidas, duas induções de parto. Uma tem direito a banho, caminhada e bola, ajudam-na com exercícios para acelerar o parto. Já a mim, o mesmo foi dito que não era necessário... mas não fiz indução de parto também? Não deveria ter feito um pouco de "ginástica"  antes de me ter sentido mal e depois de melhorar? Porque razão é que fiquei SEMPRE ligada ao CTG?

Dia 23 de Junho sinto-me com dores, muitíssimo inchada e bastante aflita de uma perna. Depois de almoço mais ou menos é feita nova indução de parto e mais tarde sou algaliada a onde momentos depois queixo-me a enfermeira de que a algalia está a magoar-me bastante por dentro. Essa situação é descartada, onde me dizem que a algalia está bem posta e que a mesma não causa qualquer dor. Torno a insistir que a mesma me está a fazer doer que eu é que estou a sentir, mas ignoram-me. 

Sensivelmente por volta das 19horas mais ou menos, peço ao meu marido que chame uma enfermeira, pois não aguento com dores e quando espirrei, saiu um burrifo de xixi. A enfermeira, já a ficar sem paciência, diz que não fiz nenhum xixi porque estou algaliada, nesse momento volto a espirrar e puff, mais um burrifo. Insisto e a enfermeira responde-me que estou algaliada que não fiz xixi na cama. Sinto-me furiosa, pois estão a tratar-me como maluquinha, quando eu vi perfeitamente quando espirrei, aquele burrifo. Levo a mão a minha zona intima e a mesma vem molhada, irritada pergunto o que raio é aquilo!

Com uma cara muito surpresa a enfermeira vai embora, voltam momentos depois para fazer novo toque. Continuo com 3/5 [não chegando a consenso] e isso não é suficiente para o bebe nascer.

O meu marido foi embora, pois o parto ainda estava atrasado. 

Não consigo recordar-me exactamente a que horas foi, mas calculo que entre as 23/24horas vem o enfermeiro levar-me para o bloco pois estou cheia de dores e muitas contracções.

Pedem para me sentar e depois colocar em pé. Aviso que não sinto uma perna, que sinto-me dormente da cintura para baixo e muito tonta. Ignoram e puxam-me pelo braço para levantar. 
Escusado será dizer que cai de joelhos no chão e ainda me dizem... " Então, Nádia?" Como se eu é que tivesse toda a culpa de não me estar a sentir bem.

Já no bloco, o enfermeiro que lá estava trata de mim e ajuda-me com a posição para levar a epidural, assim como a entrada do meu marido.

É exactamente aqui que começa então toda a palhaçada. Quando ainda estava no quarto, chegou uma outra moça também para ter bebe. Segundo ela, estava com contracções mas sem dor e que se tivesse o filho/a assim seria uma maravilha, pois ela não estava para ter de aguentar as dores do parto, se as dores começassem que o médico dela a colocasse a fazer cesariana! 

Não faço a mais pálida ideia de quem era o médico dela. Mas uma coisa é certa, por volta das duas da manha, três prai, ouvi ela no bloco de partos aos gritos e ouvi muito bem o médico a dizer, levem-na para o bloco para fazer cesariana porque eu não lhe vou fazer o parto assim, não estou para isto.

Eu olhei para o meu marido e disse... bem, talvez depois dela seja eu e a nossa menina se for preciso as 4 da manhã está aqui connosco.

Sejamos sinceros, duas induções de parto, montes de dores, super inchada, que já mal conseguia manter os olhos abertos tal era o inchaço no rosto também.

Uma curiosidade que eu não sabia, mesmo sendo o meu segundo parto [do meu Diogo a epidural não me fez nenhum efeito] é que nós sentimos a dor, sentimos quando vem, mas aguenta-se perfeitamente bem, sem qualquer stress.

A dado momento, talvez por volta das três - quatro da manhã, pergunto a enfermeira se não me vão tirar a algalia pois por vezes sinto necessidade de fazer força só que o meu corpo bloqueia quando me lembro que se a bebé sair, poderá magoar-se [não faço ideia se realmente seria assim, não sou médica e nunca passei por tal situação]. A enfermeira diz que não me pode tirar a algalia pois tenho de estar com ela devido a medicação que estou a fazer e eles tem mesmo de fazer a contagem da urina. Não consigo perceber o porque de tudo isto, mas ok.

Momentos mais tarde, entra a enfermeira no quarto mais o médico [ que por sinal naquele dia era o chefe da obstetrícia, o mesmo que lá estava quando eu fui pedir para falar com o director da obstetrícia, recordam-se de eu ter dito mais acima?] mais a médica que me atendeu a 18 de Dezembro e me disse que eu estava grávida, a mesma medica que me atendeu N vezes quando dei entrada de urgência com dores e inchada.

O médico recusa fazer-me a cesariana, diz que terei parto normal. A enfermeira passa mais informação sobre o tempo / estado e afins de como estou, que tem de ser feita a cesariana, mas o médico recusa sempre. A enfermeira insiste que não estou a fazer a dilatação, e mais algum coisa, contudo nesse momento já me começo a sentir muitíssimo cansada, com alguma dificuldade em parar o meu corpo de tremer de forma estranha, sinto-me mesmo mal e sei que a dada altura vomitei-me toda, porém não consegui virar-me e se não o tivessem feito por mim desconfio que teria asfixiado no meu vomito.

A cada instante que passa, pior me sinto, mais bloqueios de memoria tenho, mais dificuldade em manter-me acordada, de manter-me consciente. Sei que de cada vez que acordo é para choramingar de dores pois a epidural já não esta a fazer efeito.

Não me recordo bem das horas, mas sei que algures naquele momento a enfermeira traz-me um papel para eu assinar, não me recordo de o ter assinado, mas recordo-me de me dizerem que era para fazer a laqueação de trompas e que assim o médico seria obrigado a levar-me para fazer a cesariana e que também seria uma mais valia para mim, pois eu não sobreviveria a outro parto.

Sinceramente? O mais que foquei foi, o médico fazer a cesariana devido aquele papel. Lembro-me da enfermeira dizer que teria de assinar esse papel com a data de 21, porque teria de ter a data de três dias antes do parto e este calharia no dia em que fiquei internada.

Infelizmente de nada valeu, o medico mesmo assim recusou-se a fazer-me a cesariana e nunca mais me veio ver, disse que eu teria parto normal e era se quisesse parir.

Volta e meia, quando abro os meus olhos, vejo algumas enfermeiras a entrarem no meu quarto, vejo a forma como me olham e consigo perceber a pena e preocupação que têm, vejo como sussurram entre elas antes de voltar apagar de novo.

Voltei a sentir novamente o meu corpo tremer, é cada vez mais perto um do outro, estes tremores, parece que encurta o espaço de tempo. Inicialmente acordo com o corpo a ficar completamente gelado, mais no ombros e trombo, apanhando o pescoço/ cabeça. É um frio horrível e difícil de explicar, o corpo começar a tremer e não dá para parar de forma nenhuma e quando isso acontece, sinto-me a ficar com sono, o corpo a ficar mole e deixo de sentir todo o meu corpo.É como se começasse a flutuar, é horrível e bastante difícil de definir por completo esse momento.

Voltou nova dor, acordo com ela e tento gritar, mas não consigo, já não tenho força para gritar de dores, a esta atura a epidural já não faz efeito, a enfermeira ralha oiço-a discutir com o médico, oiço-a dizer que não irei sobreviver assim, mas ele não faz nada.

Não tenho força para gritar, falar, chorar ou fazer força para  minha bebe sair. O meu corpo não me responde, não consigo levantar um braço e nem as lágrimas correm pelo meu rosto, simplesmente porque não tenho força nenhuma.

Chamo a enfermeira, ela está ali ao meu lado, peço para que chame o director da obstetrícia e ela diz que ele não está, que o médico de serviço é o chefe e ele não quer fazer-me a cesariana. 

Peço por favor para me mandar para outro hospital, ou pelo menos tento dizer isso, já não sei, tal é a dificuldade que tenho para tudo.

Vem nova dor, céu cada vez são mais fortes as dores, mas o meu corpo não me obedece. E eu sinto-me inútil porque não consigo ter a minha bebe sozinha.

Chamo a enfermeira quando as dores apertam, quando sinto que será ali, eu irei apagar de vez, já não consigo mais. Já são 16 da tarde e ainda não tive a minha bebé. A enfermeira diz para aguentar só mais um bocadinho, estão na mudança de turno e que o médico já vem.

Olho para o meu marido e tento dar um sorriso, tento dizer para cuidar do nosso menino, e proteger a nossa menina. Que quero dormir. Mas uma vez mais não me sai nada por entre os lábios, contudo penso para mim, tens de aguentar só mais um bocadinho, está quase.

Acordo com vozes no quarto, com a correria e a enfermeira a sorrir-me e a dizer, é agora querida, vais ter a tua menina. Entra médicos ou acho que o são, andam todos iguais agora.

Passam-me para outra maca, seguimos caminho para o bloco, passam-me de novo para a mesa do bloco. Uma jovem sorridente fica ao pé de mim, diz que irá colocar a mascara de oxigénio no meu rosto, que ela é anestesista [ou tive um breco na memoria e só me lembro disso], volta e meia ela está a chamar-me, sempre ao pé de mim a segurar a mascara no meu rosto, ela diz constantemente que tenho de respirar, não posso parar de respirar, é só mais um bocadinho.

Mas ela parece um disco riscado, eu só quero dormir e ela só me diz para respirar, e não estou a respirar? isso é automático, ela está doida - penso para comigo - Nádia, vamos lá respira.

É a pressão que sinto no peito é porque parei mesmo de respirar, que estranho. Volto a olhar para o candeeiro do tecto, não consigo perceber mas vejo a mancha vermelha, deve ser a minha barriga, sinto a mexerem e a puxarem. Oiço um choro bem alto e sorrio, penso para comigo, ela já cá está, se está a chorar está bem, já posso descansar. 

Quente, demasiado quente, há algo a queimar-me o rosto, não sei o que é, mas queima tanto, pestanejo, tento focar o local a onde estou, oh sim, o bloco de partos o choro parou, não mentira, continua, cada vez mais alto. Caramba que quente, a minha bochecha está em brasa.

Oh espera há alguém a falar comigo ela tem qualquer coisa ao meu lado.

"Nádia, vá lá, olha a tua menina, ela está aqui, precisa de te sentir."

Oh o quente é a minha menina. A minha vista desfoca, é a minha bebé, consegui, ela está cá. e tem bons pulmões, pois está a deixar-me surda.

"Olá filhota" a voz sai esganiçada tento aclarar a garganta e tento de novo, falo com ela, perguntam me o nome da minha princesa. "Leonor" digo cheia de orgulho. Oiço alguém dizer, ela já está connosco, levem a menina.

Fico a olhar para o relógio da parede, sem ver as horas, lentamente parece que estou a sentir o meu corpo, cada pedacinho dele.
Oiço as conversas a minha volta sem qualquer dificuldade!

"... vai para analise ou ... " Ainda não consigo perceber tudo, só alguma coisa.
"Sim, sim, assim teremos a certeza de que não estamos a mandar um bocado de intestino" 

Quero responder, dizer que isso não teve piada, mas não consigo, há um peso no meu peito. "Respira Nádia" oiço dizer. 

Possivelmente era uma brincadeira entre profissionais, mas não gostei, passei por tanto, como podem brincar com isto? Mais ainda quando tenho Crohn?

Já despachada, sigo para recobro, a enfermeira é super simpática e está a puxar por mim para falar, lentamente começo a espevitar e quase que volto a sentir-me normal.

"Quando vou para o quarto?" pergunto. "A  anestesista só te dará alta daqui quando fizeres xixi, não fizeste quase nada."

Fico triste, queria ir para o quarto, queria descansar e deitar-me com a minha bebe. A enfermeira anda para a frente e para trás sinto-a a mexer na algalia, pelo menos tive a sensação de um pequeno puxão. Oiço-a falar com surpresa. "Como te sentes?" Respondo que naquele momento sinto um alivio imenso na barriga. Ela responde, pudera a algalia estava bloqueada e a tua bexiga estava a rebentar pela costura, encheste o saco. Vá, irei substituir isto e depois poderás ir para cima.

Já estou no quarto, é horrível, estão sempre acordar-me para dar de comer a bebé, ou para mudar os soros e medicamentos, ou a perguntar se está tudo bem. Medir a tensão e dar a medicação para a mesma.


Um pormenor que vi mais tarde e que o meu marido referiu foi que eu tinha uma mancha vermelha [derrame, julgo que se chama assim] no olho  direito e a minha Leonor também tinha uma mancha vermelha igual no olho direito também. Porquê?

4 frascos que nunca me disseram o que era

Acordei e algo não está bem, não consigo focar o quarto, o rosto da minha bebé nem das enfermeiras. Vejo a dobra e tudo completamente desfocado! As auxiliares vem ajudar-me com o banho, não posso estar de pé sozinha e menos ainda no banho.
E sim estou a levar os 4 de uma só vez

Os meus pés escorregam no chão, é horrível. De banho tomado, visto umas cuecas descartáveis do hospital e um penso. A enfermeira diz-me - mais tarde - que é desnecessário usar a minha roupa, uma vez que irei ser mexida e que estava algaliada, que depois a roupa ficaria suja de sangue e que o mesmo custava a sair. Concordei, claro. Era escusado estragar a minha roupa. No dia seguinte, acordo novamente aflita, sem conseguir ver e sem conseguir manter-me em pé sem ajuda.

As auxiliares questionam-me se tenho tudo pronto, explico que me falta as cuequinhas descartáveis e o penso. Ui o que eu fui dizer. A mulher só não me chamou mãe. Que era uma vergonha, usar o material do hospital, que fazíamos tudo o que queríamos e bla bla bla. Foi mais uma humilhação a juntar a tantas outras. Hoje, se me dissessem isso a resposta seria mais do que certa. Perguntava-lhe logo se aquele pedaço de rede que faz de cuecas era dela, ou se ela as queria levar para casa, mas naquele momento? A tensão estava alta novamente, a visão completamente desfocada e sem conseguir ver o rosto das pessoas, todo o que se tinha passado para trás uma pessoa sente-se horrível.  Isto sem dizer que, quando ia a entrar no duche tinha de levar um pé e depois o outro para passar sobre o rebordo, ora nessa situação eu preciso de me agarrar, mais ainda se estou a escorregar, apenas pousei a mão no ombro da auxiliar e a mesma foi a coisinha mais estúpida que pode haver. A ela só lhe digo, que receba de volta o tratamento que me deu naquela manhã.

Não existe pior sensação do que aquela em que nos sentimos inúteis, aquela em que dependemos de 3º para a nossa higiene, para tratar da nossa bebe e acima de tudo, veres que a tua saúde está cada vez pior, visão desfocada, tensão alta, mega inchada e perda da realidade.

Quando me senti no mínimo preparada para reviver tudo de novo, apresentei uma reclamação. As respostas foram o que leram logo ao inicio. 

No meu livrinho de grávida conto com 8 consultas, sendo que 1 delas, com a data de 2 de Março foi feita pela enfermeira no HSB. Em resposta a minha reclamação, a ordem dos médicos diz:que tive 5 consultas agendadas e que faltei a 1.

A única consulta que faltei, estava marcada para o dia 28 de Junho de 2018 pelas 16horas. Ora digam-me lá então. O Dr. R vê-me nas urgências no dia 20, manda-me voltar no dia 21 para ser vista e a onde sou internada, não se dignou uma única vez a ir ver-me, sabendo que eu lá estava! E marca-me consulta para dia 28 de Junho, quando a Leonor nasceu a 24 de Junho. O que é que eu ia mesmo fazer a essa consulta que faltei? 

Já agora, eu tive 1 consulta [que refiro mais acima ] a onde dei entrada de urgência e depois quando sai voltei as consultas externas... depois tive a outra consulta a 1 de Março e depois disso não tive mais NENHUMA consulta. Agora pergunto-me, a onde está o resto dessas consultas? Contou como consulta a do dia 21 quando fui internada? Ok, então e a outra consulta é qual mesmo? A de dia 10 que foi a greve dos médicos? Ou a outra que ele mandou-me ir no dia seguinte e faltou??? Pelo menos foi o que me disseram no guiché. 

Alguns dos papeis que tenho
Foi-me aconselhado enviar uma carta a explicar tudo e a enviar tudo o que tenho [fotos incluídas minhas de como estava] para a ordem dos advogados e quem sabe com sorte  seria escolhida como caso pr
o-bono, mas pensei comigo, para quê? 
Passar por mentirosa novamente? Mesmo tendo exames, papeis e tudo mais? Se o médico em questão e/ou hospital mentiu no numero de consultas que tive, em que mais mentiriam? Se o chefe da obstetrícia se recusou a fazer a cesariana mesmo tendo a enfermeira a insistir e afins, nunca na vida ela seria minha testemunha. Nenhuma das enfermeiras que tiveram naquele quarto ficariam do meu lado. Nem o médico que ordenou a cesariana. São colegas e muito provavelmente [quase de certeza] se iriam manter unidos. Era lutar contra uma parede de betão.

Agora, por favor, não digam que a causa de morte tem a ver com a idade avançada da mulher. 
A causa de morte tem a ver com a negligência e desprezo que os médicos dão as parturientes / grávidas. Obrigado as mesmas a terem o parto sozinhas quando não conseguem. Ignoram o sofrimento da mãe.

Não é justo que médicos deste género estejam a exercer, não é justo nós, mães, com gravidez de risco elevando seremos ignoradas desta forma e que desprezem a nossa vida, o nosso bem estar físico e psicológico.

Um ano e dois dias depois [visto que já é dia 26-06-2019 e 01:53], ainda estou a recuperar, tanto do Crohn, como da visão [que volta e meia desfoca e que me dá muita comichão para depois parecer que tenho pedacinhos de algodão nos olhos] Dores na zona dos rins, zumbidos nos ouvidos, dores abdominais. Este tempo todo e ainda não me esqueci que fui obrigada a fazer uma laqueação de trompas que no meu estado normal e 100% sã não teria aceitado fazer. Com 33 anos, foi-me retirado a hipótese de ter mais filhos, tudo por causa de um médico que se recusou a fazer-me uma cesariana, porque ficou com as dores do colega.

É triste em pleno séc. XXI, em 2018 [data em que aconteceu ] este género de coisas ainda aconteça e que ninguém seja penalizado por isso!


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